terça-feira, 30 de maio de 2017

Brasil



Rogério Parentoni Martins


"Brasil, meu Brasil brasileiro, meu mulato inzoneiro" (que provoca intrigas, que se faz de sonso); "deitado eternamente em berço esplêndido" (forrado com lençóis e cuecas corrompidas). Joaquim Pedro de Andrade e o nosso Macunaíma, um herói sem nenhum caráter, magistralmente interpretado pela Dina Sfat, quando pariu o pequeno Grande Otelo. A Ópera do Malandro, épico da malandragem, de Chico Buarque. Zé Carioca, o urubu malandro com camisa do Flamengo, todos personagens caricatos de uma realidade surreal. "Moro num país tropical abençoado por Deus"; como fico se sou ateu? Nossa alegórica cultura, cujo traço marcante, ficou imortalizado nas palavras de um jogador de futebol e alçado à condição de lei "levar vantagem em tudo". Não me emociono com as simulações dos endeusados jogadores de futebol: o que vejo é pura malandragem, disfarçada de talento.  Podemos dizer imoral ou amoral; a falta de caráter é amoral. O Brasil solidário é uma sofisticada peça de ilusão. Manuel Castell, sociólogo espanhol, desmascarou nossa falta de vergonha, ao apontar-nos a falta de solidariedade de que padecemos, já ironizada pela expressão "brasileiro é bonzinho". Para contar piadas de mau gosto, ocasiões em que, descaradamente, nossos preconceitos se mostram, somos campeões. Até uma fruta, marmelo, serviu para caracterizar um traço marcante de nosso caráter: a marmelada. Houve quem dissesse que honesto é aquele que não teve oportunidade de roubar, não o que trabalha direito, paga suas contas, altíssimos impostos, para deleite dos "grandes brasileiros" e seus acólitos. Falar em bando, quadrilha, súcia, corja ficou corriqueiro. Para roubar muito, não dá prá roubar sozinho, é preciso fazer promissoras alianças, onde todos ganham e muito: ninguém reclama. Um político piauiense que forjou seu caráter nas montanhas das Gerais, há tempos pontificou "esse não é um país sério", o que foi atribuído a De Gaulle. Se for ao exterior, talvez não seja prudente dizer que é brasileiro, a não ser que tenha algo em nosso país que seja motivo de orgulho, será? Em tom de chiste, que muitos podem até se orgulhar, certamente ouvirá: "Pelê, carnival, mulatá". Respondermos: "yes, we have bananas". 


"Triste Bahia"
                                                                 Caetano Veloso e Gregório de Matos
Triste Bahia, oh, quão dessemelhante…
Estás e estou do nosso antigo estado
Pobre te vejo a ti, tu a mim empenhado
Rico te vejo eu, já tu a mim abundante
Triste Bahia, oh, quão dessemelhante
A ti tocou-te a máquina mercante
Quem tua larga barra tem entrado
A mim vem me trocando e tem trocado
Tanto negócio e tanto negociante

Triste, oh, quão dessemelhante, triste
Pastinha já foi à África
Pastinha já foi à África
Pra mostrar capoeira do Brasil
Eu já vivo tão cansado
De viver aqui na Terra

Minha mãe, eu vou pra lua
Eu mais a minha mulher
Vamos fazer um ranchinho
Tudo feito de sapê, minha mãe eu vou pra lua
E seja o que Deus quiser

Triste, oh, quão dessemelhante
ê, ô, galo canta
O galo cantou, camará
ê, cocorocô, ê cocorocô, camará
ê, vamo-nos embora, ê vamo-nos embora camará
ê, pelo mundo afora, ê pelo mundo afora camará
ê, triste Bahia, ê, triste Bahia, camará
Bandeira branca enfiada em pau forte…

Afoxé leî, leî, leô…
Bandeira branca, bandeira branca enfiada em pau forte…
O vapor da cachoeira não navega mais no mar…
Triste Recôncavo, oh, quão dessemelhante
Maria pé no mato é hora…
Arriba a saia e vamo-nos embora…
Pé dentro, pé fora, quem tiver pé pequeno vai embora…


Oh, virgem mãe puríssima…
Bandeira branca enfiada em pau forte…
Trago no peito a estrela do norte
Bandeira branca enfiada em pau forte…
Bandeira…

Enfim, parece ser confortável ser amador; muitos confundem com autêntica criatividade: Esse é nosso jeitinho: em se plantando dá...

quarta-feira, 17 de maio de 2017

A incerteza das certezas



Rogério Parentoni Martins
 



Caminhava por uma praça em Belo Horizonte, quando escutei de um garoto cerca de 10 anos: “mãe, é impressão minha ou o mato cresceu?” O mato a que ele se referia é um gramado que circunda parte do perímetro da praça. A mãe respondeu: "cresceu sim, meu filho, você tem razão". A despeito de ser trivial, o episódio desse curto diálogo que, afortunadamente, pude ouvir levou-me a refletir sobre a incerteza das certezas. O garoto procedeu com cautela ao duvidar que o fato de o mato ter crescido poderia ser apenas uma impressão sua; expressou honestamente sua dúvida sobre se realmente o mato haveria crescido após sua última estada na praça. Talvez o garoto ignore, mas a dúvida e curiosidade, demonstradas por meio de sua cautelosa pergunta, são os principais "drivers" do conhecimento científico. Por isso, ocorreu-me estar diante de um potencial cientista. Ocorreu-me também que a "certeza" da mãe, árbitro com autoridade naquele momento crítico de dúvida, poderia ser equivocada por dois motivos: i) a certeza da afirmação materna poderia eliminar a possibilidade de que o garoto pudesse continuar a refletir sobre a dúvida, desvanecendo rapidamente sua curiosidade, e ii) poderia ser o início de acomodação sobre o pensar sobre eventos, triviais ou não, e estimular submissão à opinião de quem ele julgar superior a si em vivência e conhecimento. Ambos os motivos podem alimentar mitos, resultados de observações superficiais sobre a ocorrência de eventos ou fenômenos complexos, repetidos à exaustão. Quantas vezes repeti sem duvidar sequer um centímetro da certeza do que me disseram professores ou autoridades. Felizmente, não percebi tarde demais o meu equívoco. Tornei-me cauteloso como o garoto cuja afirmação estimulou essa reflexão. Espero que o garoto continue a duvidar de suas próprias opiniões e das opiniões de outros; se optar em tornar-se pesquisador possa avançar mais cedo do que estou a avançar, por ter percebido mais tarde esse aspecto importante sobre a origem do conhecimento. Finalmente, espero que garotos com tal potencialidade não sejam massacrados em sala de aula, simplesmente por duvidar e expressar suas dúvidas, transformado-se em um adulto submisso à 'veracidade' das "incertas certezas".

sexta-feira, 31 de março de 2017

São muitos os crepúsculos



Rogério Parentoni Martins

Ao alvorecer, o senhor das horas estende seu tapete de certezas. Ao crepúsculo o recolhe escasso de dúvidas. Dia pós dia, noite pós noite, estender e recolher os dias assim vividos. Cá no meu canto, interrogações decoram paredes alvas de sonhos. Quando suponho avançar, estendem-se sobre o piso: Homem esse é seu caminho?
                Como qualquer ingênuo, suaves fragrâncias desenho em realidades fictícias. Segundos nunca me foram escassos; imprimem na senda rastros imperfeitos. Imaginem, eu que alguma vez me considerei perfeito, como se necessário fosse. Faltam-me o talento de hábeis atores, o convencimento dos pios, a elegância dos filósofos, a certeza dos santos, os sonhos do poeta. O ânimo conduz-me intermitente claudicante; ciclos sobrepostos, afirmação-pausa-negação. Meros ciclos somos; cada qual a seu feitio tece a história do seu tempo. Desnecessário afirmar que a carne fenece quando os ciclos cessam.  Apenas um único momento o acaso não contará, marcado em segundos, minutos, horas, dias ou anos. Séculos pertencem a abstrações não vividas.
                Alguém me diria onde sua sólida certeza se ampara? Sua voz sairia sem o tremor da dúvida? Haveria um só homem cuja certeza lhe empurraria para abismo de olhos límpidos? O que restaria ao corpo inerte, esperança? Ouça quem ignora futuros: "não reclames, irmão, a cada qual cabe a vida rascunhada. Cerre os dentes e parta. Evite caminhos de prazeres efêmeros. Qualquer prazer deverá durar ao menos um dia sem olvido".
                Enquanto isso, aves voam seus destinos de cadáveres. À coruja restam os olhos de noites densas, sem o clarão da lua a iluminar pequenos roedores. Olhos de abutres margeiam estradas à procura de reses trôpegas. Leões de bucho cheio espreguiçam no por do sol savânico, onde gnus cabisbaixos pastam seus destinos. Por um momento, para alguns breve, a outros angustiante, impera o silêncio em todos os biomas. Cessa a verdadeira música do mundo tocada em pautas carnais. Gracejo desesperado não se ouve. Sorrisos outrora radiantes contem-se em cerradas comissuras. Nos existentes, o medo do pósvir. Haveria trama desvelada a qualquer momento? Engoliria a próxima pausa? Máquinas emudeceriam ante a falta de músculos? Só ouviríamos aquele vento que nunca cessa na órbita em movimento?
                Ato pós outro em sucessão genealógica. Atos mudam, homens não. Falsos testemunham cenas feitas de lamúrias. A carne vive a inércia que o desespero plasma. Se algo etéreo espiar dentro de nós, encontrará animais em gestação. Onde se encontra a coragem para desnudar a verdade?
                A cópula é prenúncio de imperfeição. Corpos fatigados pedem apenas descanso, para retornar ao mesmo sacrifício. O destino cinemático nos olhos vazados dos poetas e vagabundos que teimam existir. A quem foi dado o direito de conduzir a manada segundo seus próprios propósitos? Todos devem marcar o mesmo passo; os desgarrados, o látego lhes corrigiriam a rota. A tolerância admite apenas três reincidências pré-alijamento. Degredo, o destino dos eternos insatisfeitos.
                Crianças serão encorajadas a mentir para não desconstruir o construído. A todos a felicidade caberá no cumprimento das tarefas que lhes foram destinadas por detrás dos muros das escolas. Os cumpridores receberão comendas e abrigos em instituições públicas. O que é publico caberá aos cumpridores, aos demais o benefício da dúvida, desde que não se desviem das verdades concedidas.
                Palavras, meros ardis. Uma rosa não é uma rosa, é luxo fabricado. Um pássaro canta em minha mão a certeza da liberdade; em minha mão o pássaro muda. Na gaiola canta como negros em senzalas à espera do açoite. Não há palavra que minta mais que a verdade; mas os ingênuos ainda se curvam à sua soberania. O homem é um dicionário animado à frente de outro homem; à sós é outro homem. Palavras constroem pontes que desabam; desandam amores que acabam, não sanam aflições. Escolha palavras adequadas a cada ocasião, do repertório vocabular que atende a todo propósito. Palavras com sorrisos enganam mais que cenhos franzidos. Vitupério está fora de uso, embora abunde nos botecos e na intimidade dos lares. Fui criado com dicionário, hoje metabolizo palavras.
                Para que o refrão se quem ouve a música não é surdo? Refrão é para lembrar que o mesmo continua mesmíssimo, mesmo que mude a entonação, a palavra não. Solidão é silêncio de violino sem mãos; de quem se foi sem o último adeus, de quem não sorveu o sorvete que derretia ante o olhar perdido, na pura areia dos desertos metropolitanos.
                O homem é objeto animado à frente de outro homem, apenas. À sós é sorvete de morango, que não é morango, e breve será.

segunda-feira, 20 de março de 2017

Remanescente

Rogério Parentoni Martins

                  Sei que a existência não se mantém estável pela peia. A mais sutil brisa desperta emoções epidérmicas. Não emoções boazinhas, condescendentes, piegas, estímulos hipócritas apenas; emoções de túmulos frescos expostos aos vôos dos morcegos desrespeitosos da memória dos mortos. O que as pombas fazem de dia, os morcegos repetem à noite. Aquelas sobre as calvas memórias dos ilustres nas praças; estes sobre os jazigos. Nem por isso deves odiar morcegos porque são feios e as pombas bonitas. A beleza pode ocultar insidiosa trama travestida de desejo. A feiúra não se esconde sob camadas de cosméticos. Ali vem o feio; evites olhá-lo envergonhado de ter vergonha; ali vem o aleijado; não o humilhes com olhares condoídos. Assuma-te como os morcegos; previsíveis a partir do crepúsculo. Ou como as pombas, pousadas sobre seus bustos preferidos.

                A existência balanga beiço como o enforcado em tarde plúmbea de dúvidas. Os animais se apartam entre sombra e sol, segundo seus próprios instintos. Reparastes andorinhas pousadas em fios de energia? Entre um e outro corpinho de freira, espaço medido com a precisão de uma asinha aberta. Ultrapassou, leva um chega prá lá, em breve, incisiva bicada. A existência quer o vazio, precisa de oxigênio para aliviar a angústia do suspiro contido.

                Os corpos animados se sucedem em procissões intermináveis. Sequer suspeitam sobre o destino da rota. Seguem de olhos fechados o trote da manada. A suposta segurança da manada não elimina a apreensão das pálpebras. O vivo sempre alerta? Evita bueiros carcomidos pelo tempo. Suspeitaria dos subterrâneos misteriosos? Temeria a solidão do grito? Socorro não alcança a profunda escuridão. Grite alto, ferido de morte: sou humano! Ninguém escutará, ocupados estarão como o eco de seus próprios gritos. Apenas mais um grito, apenas mais um humano.

                A chuva cai fria como romance de Stendhal. Corvos disputam espaço nos ombros do enforcado ainda quente. Bicam entre si, esvoaçam, arredam-se querendo alcançar-lhe os olhos esbugalhados. Por que preferem os olhos os corvos? Que fascínio lhes exercem órbitas vazias? Urubus não. Seus corpos encarquilhados de experiências mortais, aguardam o corpo imóvel. Não lhes interessam os olhos. Bicam-se por causa do fígado. Não se empoleiram, apenas aguardam a hora dos urubus.

                As chamas da lareira crepitam em teus olhos azuis. Teus cabelos negros escorrem pelo meu peito descrevendo sinúsia. Penso que te amo. Não sei o que é amor. Que confusos sentimentos incendeia. Tremo ao tocar-te a pele untada de fragrâncias suaves. Gosto do teu ressonar distraído. Teu corpo indefeso amparado no meu. Como dizer-te que não sei amar-te?

                A chuva ainda cai como em romance de inverno. O tapete desarranjado no arranjo dos corpos. Nas taças vazias restaram tintas nódoas discretas. Ainda ressonas inocente como se a vida coubesse plena no momento. Como desatar o fio da finura de um cílio que nos une? Noites de inverno não merecem sobressaltos. São noites de aconchego. Quanto mais te aconchegas, a coragem se me esvai. Não durmo. O que ela sente quando em meu corpo se ampara? Não vês que sou um desconhecido perdido em noite de inverno europeu? Tomas meu corpo como teu. Desejas o amálgama.
                Ouço o relógio da igreja fantasiado de destino. Não te conto quantas foram as badaladas, em vigília a um corpo que no meu se ampara, em noite de chuva fina que antecipa a neve em Stendal.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Vinte quatro horas de vários dias inglórios

Rogério Parentoni Martins


Tanto faz o início, ao deitar ou levantar. Os dois atos, inversos, são contínuos. Acordo após 6 horas de sono ininterruptos. Apenas os olhos abrem; o restante do corpo inerte, não resiste à perplexidade. Cada acordar é como um parto natural: a vagina a cama; o eclodido sou eu. São minutos até ouvir estalar algo dos pés. O espreguiçar sempre me lembra gato; muito menos flexível, meu caso. Durmo nu, querendo a liberdade que só o corpo despido permite. Às vezes, quase sempre, o membro ingurgitado, como se quisesse algo mais que urinar. Manobro o corpo de lado, levanto lateralmente para não comprometer a lombar. Levo a mão apalpando a coxa da prótese total de quadril, que há 10 anos penso poder se soltar. O banheiro da suíte recebe um corpo de hesitantes primeiros passos. Não me olho ao espelho, assim evito o susto. Sento ao vaso para urinar, mão sustentando o queixo, me lembra Rodin. No meu caso, apenas pensamentos intermitentes, sem nexo. Na posição permaneço alguns minutos. Levanto-me segurando a tábua para evitar que colada às coxas possa se desprender e provocar barulho. Chega a hora do espelho. Cabelos desgrenhados pedindo gumex, do qual poucos lembram; a maioria calvos. Repito a rotina como se fosse necessário para dar ordem ao dia. Com sabão neutro esfrego os olhos fechados, antes de ensaboar os óculos. Penso que preciso enxergar o mundo claramente, mas não sei por que. Molho os cabelos, escovo os dentes rapidamente, apenas para tirar a gosma, pois o farei novamente após o café. Faz calor, mas desligo o ar condicionado da sala (24.000 BTU, British Termal Units), que mantive ligado a noite inteira. Não sei também por que preciso saber isso. Aborto pensamento que me impele a explicar mais o significado de BTU. Penso, se fosse eu a ler, ficaria de saco cheio. A sala continua-me familiar. Dá-me sensação de intimidade e proteção. Penso sempre em ligar primeiro a televisão; retrocedo para manter a liturgia e ando em direção ao fogão, onde a cafeteira italiana, abastecida no dia anterior, aguarda o fogo da trempe. A baguete esquartejada e lambuzada de manteiga, espera meu comando ao forno para que a manteiga derreta até os quartos ficarem crocantes. Retiro a cafeteira ao primeiro manifestar da válvula de segurança; evito a fervura. Na mesa, um apartado de tecido de jogo americano serve de suporte para a cafeteira. Retorno à cozinha, abro a geladeira de onde retiro suco de laranja integral Valle e iogurte Itambé de coco. No copo vazio da água levada ao quarto antes de deitar, verto três dedos do suco. Em seguida corto ao meio o mamão Havaí, ingiro 10 sementes, após mastigá-las, para liberar algo que dizem cicatrizar pequena lesões na parede do estômago causadas pela ingestão diária de vinho. Enquanto aguardo os quartos da baguete, tomo o suco e ingiro a polpa das duas metades do mamão. Já com o copo cheio de iogurte, tomo os remédios diários, antihipertensivo e antidepressivo. Terminado o café, sento-me ao sofá para assistir o Bom dia Brasil, mas não até o fim: substituo-o por jazz que ouvirei até a hora do almoço. Enquanto isso penso sobre o que almoçarei: se algo já preparado ou preparei algo. Retorno ao banheiro onde leio a Folha de S. Paulo, enquanto faço necessidade elementar. Apesar de Dr. Dráuzio Varela ter comentado sobre o risco de hemorróidas e que banheiro não é biblioteca. Didático, mas não funciona. Em seguida ligo o computador e trabalho mais ou menos 2 h, às vezes em texto técnico outras vezes em textos semelhantes a esse. Há os dias em que não escrevo mais do que poucas palavras, corrijo gramática, mas o tédio se apodera de mim. Às 10 h paro, como uma laranja serra d'água com o bagaço, no Rio Grande do Sul conhecida por laranja do céu, devido a razões intestinais. Saio às vezes sem rumo ou para supermercado à procura de ofertas. Retorno já perto da hora do almoço; continuo a ouvir jazz. Meio dia começo a ingerir salada de folhas com tomate, azeitonas e palmito. Enquanto isso no microondas esquento o prato principal. Durante o almoço mais jazz ou jornal televisivo. Termino o almoço, bochecho várias vezes para retirar resíduos alimentares: o gosto do café se alteraria se escovasse os dentes, o que faço cerca de 30 minutos após beber o café, este em cápsula na máquina Nespresso, presente de minha irmã. A manhã felizmente já se foi. Recosto no sofá onde cochilo parte de filme B que acostumei a assistir sempre pós-almoço. Se perco trechos, não me faz diferença alguma. Às 14 h, verifico e-mails, percorro sites de relacionamento e tento trabalhar mais um pouco, o que raramente consigo. Às 16 h como uma fruta antes de ir a padaria comprar outra baguete, no jantar comida parcialmente, às vezes recheada de carne moída com gorgonzola e cebolinha. Às 17 tomo banho e, às segundas e quintas, vou ao Café com Letras do CCBB, na praça da liberdade, para ouvir jazz ao vivo. Levo comigo o vinho de preferência, pois não me cobram rolha. Sento-me à mesa cativa e brindo uma taça com o gerente que apelidei Dártagnan. Mas antes disso, o dia para mim se arrastara penosamente e a noite parecia nunca chegar. A noite me importa; sinto-me bem, especialmente após abrir um vinho, ver um ou dois filmes A, quando não ouço jazz, à espera do sono, não antes das 24 horas. Quando tenho tédio não consigo ler, a não ser que seja um livro excelente. Atualmente leio o "Filosofia do Tédio", de um filósofo norueguês e o ótimo "A lua vem da Ásia" do redescoberto Campos Carvalho, mineiro de Uberaba. O tédio é terrível, sem causa aparente. Não pode ser combatido. Mesmo quando o julgo findo, seu espectro me ronda como fera faminta.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Pau de Jumento

Rogério Parentoni Martins


Maria fumaça bufava como toda quarta feira seis da tarde. Ela quinze, eu 17. Ela dentro, eu fora. Nunca deveria ter ido à Estação de Ferro Leopoldina, em Ponte Nova, Minas Gerais. Ano não importa, perdido tá no passado, envolto em neblina do rio Piranga e na fumaça da chaminé do trem de ferro abastecido à lenha. Nunca devia ter ido à despedida. Adolescente não despede. Chateia, chora, fica com raiva, mas pega logo outro rumo.
                Os homens que viajam de maria fumaça usam sobretudo branco, nem tanto, cinza de fumaça, de comprimento na metade das canelas. As fagulhas da chaminé da máquina queimariam a roupa domingueira e atrapalharia a triunfal chegada ao Rio de Janeiro. Capital na época, homem tinha que ser de terno e mulher-esposa de costume sóbrio com barra na panturrilha, sapato social salto Luís quinze; às vezes o chapéu feminino que realçava o rosto era bem discreto; em alguns aqueles penachos no cucuruto. Nada de decote ou saia no joelho. Isso era coisa das mulheres de vida fácil, que os maridos comiam às quintas, na zona, religiosamente.
                Sim, o padre sabia, mas não pregava sermão nos abastados da cidade; para eles apenas: perderia o dízimo, os leitões a pururuca, os lombos assados, o arroz de forno com queijo ralado e petipoá. Pobre ouvia cada uma!... Muito tempo mais tarde arrependi de não ter virado padre de paróquia do interior. Desses lascivos e glutões que não deixavam nenhuma beata pro bispo, só as feias, vesgas de ancas curtas e pernas tortas. Se chegava no confessionário, era "ripa na chulipa!". Fecha os olhos, minha filha, fique de quatro como ovelhinha, abaixe a calcinha: o Senhor vai te penetrar. Já com o membro inteiramente aconchegado, as mulheres suspiravam: Glória ao Senhor, o Senhor é meu pastor. O cajado do pastor pastoreando as ovelhinhas... Diziam os padres apenas desse modo ser possível reforçar a fé das mulheres no Senhor e evitar que pecassem. Pau de padre era benzido, pensavam as beatas. Eram conhecidos no interior de Minas os filhos de padres, meninos ou meninas sérias de terço e bíblia na mão. Os meninos machos treinando prá padre; as meninas fêmeas prá beatas ou freira. Puta num entrava na igreja matriz, ouvia missa de fora. Os padres gays pedófilos chamavam os meninos gordinhos de bunda grande: cavalim, cavalim prá ganha santim. A única preocupação dos padres era Deus. Você acreditaria que todo padre acredita em Deus? Inocente! Deus é útil, apenas. Prá que fui ler "Velhice do Padre Eterno" de Guerra Junqueiro, prá quê, gente? Cismei com padre depois da leitura. Quando mineiro cisma, tem jeito não: empaca igual mula arisca quando vê bicicleta. Mas sempre é tinhoso, cigarrim de palha, cuspe de lado e sorrisim desses curtim para não dar muito cabimento. "Minino num arreganha as canjica prusotro", ouvia sempre.
                Hoje me lembro apenas do aceno de luva branca e da coluna de fumaça dobrada pelo vento. Aceno defumado pensei na época e me lembrei das linguiças penduradas sobre o fogão de lenha. Leva quinze dias prá defumar. Queijo prá curar leva mais. Tem que tampar com pano de prato: moscas aos magotes. Moscas mineiras não dispensam um queijim meia cura. Para pão de queijo o dito tem que tá bem curado, bom prá ralar Também, onde já se viu chiqueiro perto da cozinha com janela sempre aberta prá fumaça sair. Por causa do chiqueiro, vivia de bicho de pé que mãe tirava com agulha de costura.
                Mal o defumado sumiu na primeira curva, já pensava na zona. Dezessete no quengo é hormônio prá mais de litro! Se bubiar, sai pelo ouvido, igual jato dágua comprimido ou pinto de minino mijando. Aqueles pinto com bico de lamparina, que parece uma tromba mal crescida de filhote de elefante anão que dá no Siri Lanka.
                Esse trem de misturar assunto com conversa mole faz escrita render. Todo mundo tem hora pra conversa mole. Na venda então, final de tarde, junta sempre uns dez. Qual cidade do interior num tem pinguço e mintiroso? Cachaça de cabeça de alambique, daquela forte, que queima da boca ao cú. Cú tem que ter assento, já pensou cú sem assento? Cú sem acento é pescoço em francês. Já vi mãe xingando minino porque falou cú: "minino, isso é bobagera; se falar de novo, tapa na boca; deixa eu pegar!".
                Tem escritor que fala que mistura de assunto é técnica. Nunca tive, acho enrolação. Vai ver que são sinônimos. Não esqueço Rafael Bicanoa, prof. de português da Escola de Comércio, metido a latinista, mas era mesmo latrinista. Repitam alunos: "sin, prefixo= junto; ant, separado": se fosse em inglês sin era pecado e ant formiga. Anatomia, separar perna da cintura pélvica e braço da cintura escapular. Tem que desarticular que a peça sai inteirinha. Um minino mei bobão, perguntou: "professor, sintopéia é muita perna junta? Se rancá as pernas dela, ela rola?" É cada minino bobo no interior. Bobo só nas horas vagas. O senhor já ouviu falar sobre quem se faz de bobo prá viver? Mineiro é especialista na arte, principalmente quando faz negucim. Faz de bobo, mas os olhos tão correndo avaliando o produto. Tem negociação que dura mais de mês. Um ganha, mas ganha pouco. O trem é bem isprimido.
                Ela nunca me escreveu. Quando a fumaça passou já não lembrava mais da luva branca. Tava era numa meteção na zona, danada. As moças prá casar só deixavam botar nas coxas e pegar nos peitim, peitetes, peitos e peitões. Peito de todo jeito, prá todo gosto. Mas as que deixavam tinham quase certeza de ter fisgado o mão boba com anzol de surubim. Lembro que um dia correu a cidade: fulano só tinha posto nas coxas. Quem acreditou, nove meses depois ficou encabulado com o fulanim nascido. Família dava explicação, para se safar: só pode ter escorrido das coxas pra lá; se chegar na porta os rabichudim ligeiro nada até encontrar o pontim, parecido com um ovim miúdim, entrar e galá ele. Ou que quando a moça que deixou se lavava no banho ajudava empurrar os rabichudim prá porta. Garantiam que sabão num matava eles e que um médico disse: o espermatozóide, nome do rabichudim, vive 24 horas. Mas eu me perguntava: vive um dia aonde? Se a porra secar, ele num rompe, fica igual roda de carroça atolada. Tirante gêmeos, cara dum fuçim do outro, é só um mais ligerim que consegue entrar, deixar o rabim prá fora e gala o pontim. Pode ser ligeiro que for, na porra seca encrava.
                Dois carroceiros que moravam no pito, Joaquim Zoeira e Sô João mei pé ou joão pepé. O primeiro, do morro já dava prá ouvir a voz dele. Sô joão pépé, era mais quetim. Só se ouvia o rangido das rodas sem graxa no eixo rodando no paralelepípedo. Eles carregavam de tudo, poste, moirão de cerca, geladeira, máquina de costura, cama, guarda roupa, areia, tijolo, saco de açúcar, feijão, arroz... Num enjeitavam nada. Tinha pena quando o chicote lanhava os quarto do burro. O peso era muito: o bicho mastigava esforço dos grande prá puxar aquela pesaria. Dava até escuma nos canto dos beiço. Chicote no lombo: "vamo burro, vamo". As vezes, no meio do morro, tinha de parar e calçar as rodas da carroça prá esperar o burro descansar. Aí ele ganhava água e comia um bornal de capim fresco. Enquanto isso, Zoeira, ficava gritando: "aí zé da véia, já vai, né? Ô boca murcha sinuqueiro, ô caminhão de osso! Desse só via costela, carne québom nenhuma. Naquele tempo podia esperar burro descansar. Naquele tempo ninguém conhecia pressa. O dia demorava um mês prá passar quando estava em aula; nas férias era rapidim. No grupo escolar tinha Eva, servente, sorridente. Eu cantava quando ela passava: "Eva me leva, pro paraíso afora, eu tenho muita roupa, mas jogo a roupa fora". Eva ria:" ô minino danado!"

                Uma vez, os minino descobriram num pasto perto de minha casa, uma égua dadeira que só! Era só bater de leve na anca dela que encostava no barranco. Formava fila grande. Todo mundo queria ser o primeiro; o último tava lascado naquela melação. O hábito de comer animais no interior era disseminado: galinha, porca, cabra, égua. Se tivesse tatu, capivara, cutia os meninos traçava. Só tinha que ser mulher fêmea. Uma um sujeito, apesar de saber, tava tão de urgência que meteu num jumento macho e o cú travou. O jumento começou andar e o sujeito sem jeito de separar indo atrás. Só depois de passar pela igreja e ouvir o xingo do padre, o jumento relaxou. O sujeito ficou um arraso. Inchado, deu até bolha d'agua. Diziam que bosta de jumento macho era venenosa. O apelido veio logo: pau de jumento. Uns riam quando ele passava e diziam: "se o jumento resolver cobrar, cê tá nágua! Vai ver o que é bom prá tosse!" Pelo bem pelo mal, evitava passar perto de jumento macho ou fêmea, podia confundir: jumento mulher ou home é tudo igual: ele num podia bubiá. Vai que o jumento lembrava dele e começasse a zurrar. Pior se o trem dele começá a crescer e ficá pendurado que nem linguiça no defumador. Aí o povo ia deitar e rolá nele. Cidade do interior é assim: gozação corre rua!

Dois homens em dois atos

Rogério Parentoni Martins


Clarindo que poderia ter sido Diógenes.

Jurisprudêncio nasceu filho de advogado fracassado. O pai colou grau em uma dessas faculdades de esquina, com lanchonete em baixo, farmácia ao lado e salas de aulas enfileiradas em corredor iniciando-se ao fim de estreita escada. Qualquer rábula interiorano o superava em conhecimento. Seus professores não escondiam a incompetência, oculta nas tiradas em latim, provavelmente decoradas do Almanaque Capivarol, que nos tempos de hoje ainda impressionam a alguns: Alea jacta est, fiat lux, ex-nihilo, mutatis mutandis, Libertas quae sera tamen. Essa a mais proferida, referente à bandeira Minas Gerais, seu estado mater. Embora achasse sonoro, usava raramente ex-libris; nunca lhe entendera o significado. Com as decoradas latinices no colete, partiu para o pugilato laboral apenas delas munido. Se foi exitoso em único processo, nunca se soube, tal era sua infrequência no fórum. Aparecia uma ou duas vezes por ano, sempre alerta, para gastar seu latim com os mesmos "piedosos" que lhe davam alguma atenção e na roda do cafezinho zombavam dele. Dr. Clarindo fazia questão do Dr., mantido em alguns cartões de visita encardidos, cheirando a naftalina, que nunca saíram do bolso do paletó. Não dispensava o paletó, apesar de desfigurado, bolsos frouxos e cotovelos puídos. A indumentária resistia precariamente desde a formatura, quando o recebeu de um tio, que ainda acreditava em seu sucesso, e dissera tê-lo usado apenas única vez. Foi o único paletó em toda vida do Dr. Clarindo; escovado, com antiga escova de sapato já meio calva, para retirar quinzenalmente a poeira acumulada nas percorridas léguas semanais. Tentou vender caixões sob medida de lar em lar; todas infrutíferas tentativas. Como era época pré-Google, colocava o sustento à mesa, oferecendo de porta em porta a Enciclopédia Barsa e bilhetes da loteria mineira. Gostava repetir que a "mineira só dá para mineiros", sem maldade alguma, sequer quando a substituíram por "mineira só sai pra mineiro". Alguns que o recebiam à porta, se impressionavam com a erudição demonstrada ao citar as expressões do Lácio, herdadas dos luminares do direito civil de sua faculdade. Não era daqueles com vocação nata para corrupto; julgava-se imaculado, o homem mais honesto de todos os tempos; o que Diógenes procurava com a lanterna à óleo de baleia. Soubesse disso, certamente trocaria de nome ou adicionaria o do filósofo ao seu: Dr. Clarindo Diógenes Pires. De fato era um homem simplório, ingênuo, acreditava nos políticos, características geneticamente herdadas da mãe e que Jurisprudêncio também recebeu. Sonhava Dr. Clarindo com viagem a Paris, desde o dia em que folheava a Barsa, que nunca de fato lera, e soubera que Paris era a Cidade Luz. Não sabia o que significava, mas a imaginação o levou a cenários absurdos em que misturava idade média com o século das luzes, que alguma vez ouvira mencionar em uma das aulas de direito, talvez de filosofia. Mesmo que soubesse seria impossível alguém constatá-lo: se perguntado, responderia apenas entoando as expressões latinas comezinhas. Apesar da indigência intelectual e vida quase miserável, Dr. Clarindo era otimista tão irrefreável como Cândido de Voltaire. Acordava sempre com a mesma disposição proferindo: sol lucet! Até mesmo em dias nublados: sol semper lucet! Inesperada sensibilidade poética, foi-lhe desvendado por Jurisprudêncio após a morte do pai: vários delicados poemas, escondidos por vergonha de seu português, que de alguma forma suspeitava limitado. Se soubesse latim, os escreveria nessa língua decretada morta. Jurisprudêncio orgulhava-se do pai; organizou os poemas e os publicou em modesta brochura, tiragem de apenas 20 exemplares, distribuídos na praça da Liberdade em uma manhã de sol. Apenas dois exemplares sobreviveram: o do filho e aquele que chegou-me à mão por meio de um amigo. O título deu-lhe singelamente o filho: Gotas poéticas. De todos, o poema que mais me tocou transcrevo, confirmando a autoria do poeta, cujo pseudônimo era Cícero Pires:

Ventos recortam no céu
Nuvens de versos rurais.
Carneirinhos pulam sonhos,
Corujas espiam
Estrela fulgurante.
Como pode ser tão só
Um céu tão brilhante?

A morte e sepultamento foram discretos como foram seus poemas. No velório, um amigo de Jurisprudêncio, auxiliar de almoxarife da prefeitura, tão ou mais discreto que o falecido. Ambos em silêncio, apenas velando o corpo sem alma. No sepultamento houve maior presença. Após cobrir o caixão de terra, o coveiro, respeitosamente, parou alguns minutos, de olhos cerrados e cabeça inclinada em direção ao túmulo. Não que soubesse algo sobre o poeta, mas o fazia em todos sepultamentos, quando ficava só, antes de fechar os portões do cemitério, diga-se independentemente da posição social do falecido. Talvez pensasse: "todos os mortos ficam na mesma posição" Assim, Dr. Clarindo cairia no esquecimento, mas não como Cícero Pires, gravado nas duas cópias sobreviventes da brochuras poéticas que sobreviveram.

Jurisprudêncio Pires, auxiliar de escritório


Jurisprudêncio era o pai outra vez. Pensara em cursar direito, mas terminou o ginásio e obteve emprego de auxiliar de escritório em uma firma de atacado. Essa firma vendia de tudo: penicos, amarrados de ferradura, barricas de soda cáustica, cueca samba canção, velas, latas de biscoito Confiança, rapaduras, resmas de papéis para escritório, celofane, cadernos escolares com ursinho na capa, fósforos Fiat Lux e palitos Gina. Desconhecia Jurisprudêncio as evidências fósseis da existência de palitos utilizados pelos Neandertais na higienização dos dentes. Lembro-me apenas desses itens de uma imensa lista, a julgar pelo enorme galpão, onde era empilhada a mercadoria. Rigorosamente, às sete, Jurisprudêncio estava na porta da firma à espera que abrisse. Cumprimentava quem encontrasse com inaudível bom dia e se dirigia à pequena mesa, cheia de notas fiscais, cadernos de lançamento de despesas, vendas e impressos avulsos para depósito do dinheiro ou cheques. Só saia no horário de serviço para satisfazer necessidade fisiológica premente, ou quando a cigarra anunciava horário de almoço e fim de expediente. Viveu em edícula alugada pela dona que morava na casa principal. A senhoria nunca ouviu barulho que de lá viesse, desde o primeiro dia de aluguel até o passamento de Jurisprudêncio, em uma tarde qualquer, após 30 anos de aluguéis sempre honrados no dia 5 de cada mês.